O Princípio Cosmológico de Einstein afirma que o Universo é muito parecido em todas as suas partes e que conserva as mesmas propriedades em igualdade de circunstâncias. Assim, não são as galáxias que se distanciam de nós especificamente, e sim que, na realidade, se distanciam todas umas das outras.

A Origem da Matéria

As doutrinas científicas sobre a natureza da matéria, que gozavam de validade e reconhecimento até pouco tempo, baseavam-se em três pressupostos iniciais que, como tais, eram indemonstráveis.

A matéria não teve origem;

A matéria não terá final, tampouco, é eterna;

As leis materiais transcorrem independentemente do observador.

Os ditos princípios constituem a hipótese básica sobre a qual se sustentava o método científico.

Dissemos que “se baseavam” dado que, pouco a pouco, estas idéias tiveram de se modular profundamente aos descobrimentos que a Astrofísica, a Física Quântica e outras disciplinas realizaram nas últimas décadas. Com efeito, a matéria não teve origem, é bastante provável que nunca tenha final, e os sucessos ultramicroscópicos que regem os macroscópicos e cotidianos nunca acontecem com independência do observador.

Este artigo pretende realizar uma aproximação destes novos postulados científicos.

Que idade tem a matéria? Em quantos anos podemos cifrar a antiguidade das estrelas e galáxias?

Uma das poucas coisas que sabemos com certeza sobre as estrelas é que elas se movem. Ao fazê-lo, a luz que emitem, e que delas recebemos, modifica-se. É como quando escutamos a sirene de uma ambulância que vem até nós; então nos parece aguda (menor longitude de onda), porém quando passa por nós e se afasta o tom se faz mais e mais grave (maior longitude de onda). Este fenômeno se conhece como o “Efeito Doppler”, e já foi demonstrado válido, não somente para as ondas físicas (como o som), como também para as eletromagnéticas (como a luz visível e outras radiações).

Este efeito, descoberto pelo matemático de mesmo nome em 1842, foi utilizado na Astronomia. Pensou-se que poderia explicar as diferentes cores das estrelas visíveis. Segundo o Efeito Doppler, aquela fonte luminosa que se distanciava da Terra emitiria uma luz que ficaria mais “grave”, por assim dizer, alargaria sua longitude de onda; em termos científicos, seu “espectro aceleraria até o vermelho”, a cor de sua longitude de onda mais cheia de luz visível. Ao contrário, se a estrela se aproximasse, sua luz viraria azul (a luz de longitude de onda mais curta) tal como já terão adivinhado seguindo esse raciocínio.

Ainda que o que se modifique não seja a cor visível das estrelas, mas o seu espectro, tal como se demonstrou, começou-se a catalogar toda fonte luminosa que se observava no céu. Contudo, à medida que aumentava o número de tais observações, comprovou-se que, salvo umas poucas galáxias próximas, como Andrômeda, por exemplo, o resto do Universo conhecido parece fugir de nós. Este feito foi aceito universalmente quando, em 1929, Hubble demonstrou que as mudanças para o vermelho das estrelas aumentam em proporção à distância de nós. Hoje se sabe que esta proporção é de 15 km/s em cada milhão de anos luz de distância (valor da denominada “constante de Hubble”).

O Princípio Cosmológico de Einstein afirma que o Universo é muito parecido em todas as suas partes e que conserva as mesmas propriedades em igualdade de circunstâncias (quer dizer, é homogêneo). Assim, não são as galáxias que se distanciam de nós especificamente, e sim que, na realidade, se distanciam todas umas das outras. Se isso é certo, e tomando o valor da constante de Hubble, poderemos nos remeter ao passado, deduzindo que entre 20 e 40 bilhões de anos atrás toda a matéria do Universo conhecido estava reunida num só ponto de propriedades insólitas. Antes desse momento, pode-se dizer que existia algo similar ao nada (teoria do Big Bang, ou Grande Explosão, tão popularizada hoje em dia).

Este estado de coisas tornou-se extremamente incômodo. A Ciência foge de irregularidades pontuais e a natureza desse momento do passado ultrapassa com acréscimo as explicações e postulados científicos. O próprio Einstein, desde seus inícios, advogou em todo o momento por explicações racionais, mensuráveis e observáveis, fugindo de tudo o que pudesse supor uma evidência da “criação” do Universo.

Em 1964 os laboratórios da Bell Telephone possuíam uma colossal antena de rádio em Crawford Hill, Nova Jersey, com a qual Arnold A. Penzias e Robert W. Wilson tentavam medir as ondas de rádio emitidas por nossa galáxia. Através de várias peripécias, que eliminavam erros de medição (incluindo o desalojamento de pombas, que haviam escolhido tão peculiar lugar para construir seu ninho de amor), registraram uma longitude de onda relativamente curta que continuaram atribuindo a interferências de algum tipo. Variando a direção da antena, a hora das observações e o lugar do planeta no espaço (medições estacionais), concluíram o descobrimento, na primavera de 64, de uma muito apreciável quantidade de microondas equivalentes a 3’5ºK, independente de qualquer direção medida. Isso indicava que, claramente, esse ruído não procedia da galáxia, e sim de um volume muito maior, de todo o Universo!

Ambos os cientistas, temerosos de anunciar esse dado totalmente improvável e estranho, telefonaram a um radioastrônomo, Bernard Burke, que por sua vez havia assistido uma palestra de Ken Turner, na Carnegie Institution, sobre uma conferência, que Turner havia ouvido na Universidade John Hopkins de outro colega, P.J.E. Puebles. Puebles afirmou que, se fosse correta a teoria do Big Bang, deveria permanecer um fundo de radiação de uns 10ºK, Penzias e Wilson entraram em contato com Puebles e com a Universidade de Princeton e os cálculos teóricos, corrigidos e melhor guiados, demonstraram que este resto de radiação cósmica coincidia quase que exatamente com o valor experimental encontrado.

O que, por casualidade, observaram esses jovens cientistas foi o resto de radiação emitida por bilhões de graus de temperatura necessários para que, no começo do Universo, a uma dada temperatura e pressão virtualmente infinita, os átomos de hidrogênio se combinassem entre si e dessem lugar a novos elementos. O que Penzias e Wilson haviam gravado não era, nem mais nem menos, do que o “som” do Big Bang. As coisas iam se esclarecendo. As galáxias se afastavam umas das outras como o resultado de um enorme estalo, naquele único ponto em que o Universo esteve concentrado. Inclusive havia-se encontrado e registrado, teórica e praticamente, o som da dita explosão.

A matéria teve sim uma origem.

O Final da Matéria e dos Neutrinos

Baseando-se nas equações de Einstein, o matemático russo Alexandre Friedman demonstrou que o Universo teria duas possibilidades. Se a densidade fosse baixa, quer dizer, se a matéria conhecida se revelasse insuficiente, a força de expansão do Big Bang disseminaria os pedaços desse Universo até diluí-los no infinito.

Ao contrário, se o valor da densidade do Universo fosse superior a um certo valor crítico, a atração gravitacional frearia o estímulo inicial, e não só isso; possibilitaria que, em um futuro remoto, a matéria do Universo, uma vez freada, fosse se atraindo mutuamente, “caindo” de novo até um centro comum e voltando a concentrar-se, provavelmente para explodir de novo e começar um novo ciclo.

O primeiro modelo é conhecido como “Universo aberto”, enquanto que o segundo denomina-se “fechado” ou “curvo” e, com certeza, lembra enormemente o similar hindu da expiração-inspiração de Brahma como responsável pela manifestação-não manifestação do Cosmos.

A próxima pergunta é: que densidade tem a matéria de nosso Universo? O que parece é que o valor limite teórico oscile ao redor de 6×10-29 g/cm3 (quer dizer, um 0’0… e mais 27 zeros com um 6 no final). As discussões sobre o valor real da densidade da matéria presente no Universo são muito acaloradas e, como era de se esperar, existem dois grupos que às vezes se enfrentam e defendem fortemente (nem a ciência se livra do inevitável arrebatamento humano), cada um de seu lado, um valor, em um caso, superior, e em outro, inferior ao previsto. E, naturalmente, ainda não entraram num acordo.

A matéria comporta-se de uma maneira muito curiosa, ou melhor, os esquemas matemáticos com os quais se pretende explicar seu comportamento têm perdido a naturalidade que caracterizava o conhecimento antigo. A moderna Mecânica Quântica, um autêntico alarde de abstração, onde muitas vezes para se estudar a matéria abstrai-se dela, tem em seu saber um número enorme de partículas e subpartículas, que aumentam continuamente, com as quais pretende explicar a natureza do mundo subatômico e a origem, manifestação e observação do mesmo.

Entre essas partículas há uma verdadeiramente curiosa: não tem massa, não tem carga, não interage energeticamente… é um diminuto fantasma, ainda assim presente em qualquer reação de transformação de partículas. Referimo-nos ao neutrino.

O neutrino aparece cada vez que uma partícula muda sua natureza mediante radiação, intercâmbio e colisões. Portanto é onipresente. Todos estamos envoltos em neutrinos, em uma espessa sopa de neutrinos provenientes das reações termonucleares do Sol em sua maioria, ainda que também nos visitem os nascidos em misteriosas regiões do Infinito, surgidos em estranhas combinações quânticas. O que acontece é que não percebemos, pois uma vez nascidos (lamento utilizar uma terminologia tão “animista”, mas é inevitável) apenas interagem com o restante da matéria. Um jato de neutrinos, que viajam á velocidade da luz, pode atravessar a Terra, sem desvios nem paradas. Foi calculado que poderiam lançar-se através de 10 milhões de anos luz de chumbo (a cifra é impossível, porém descomunal) sem diminuir sua incidência em mais de 10%.

O estranho nesse caso é que há dois tipos de neutrinos, um associado ao elétron (partícula muito familiar) e outro ao muon (menos popular e que seria uma espécie de elétron mais pesado). Quer dizer, a natureza diferencia perfeitamente entre um e outro tipo de neutrino. Como o faz se não possui propriedades que os distingam?

Modernas investigações, que remontam a 1980, analisaram esta partícula sem massa nem carga, chegando à conclusão de que pelo menos algum tipo de neutrino teria algo de massa. Assim, elétrons e muons poderiam reconhecer cada um sua espécie neutrínica sem possibilidade de erro, coisa que, de fato, realizam. Este feito enfrenta a Teoria da Relatividade (a mais universalmente aceita e a que melhor resistiu a posteriores revisões), que estabelece que nenhum elemento material pode viajar à velocidade da luz e que, se o faz, carece de massa, logo não é material. Porém isso já outra história…

Posto que os neutrinos são tão importantes, com uma média de 100 por cm3, o descobrimento provável de que possuem uma massa diminuta, quase inapreciável, poderia mais do que duplicar a massa total do Universo. Nas palavras dos autores desta investigação, “esta duplicação alteraria substancialmente as interações gravitacionais da matéria nas galáxias. Ainda assim é curioso que as massas aparentes das galáxias, estimadas a partir do pequeno número de estrelas e da quantidade de pó e gás presentes, pareçam ser umas 10 vezes pequenas demais para manter unidos os cúmulos. Um mar de neutrinos, com uma massa de 10 eletrovolts, estendido por todo o espaço poderia explicar a coesão dos cúmulos. A uma escala ainda maior, a massa dos neutrinos influenciaria na evolução global do Universo… Um valor suficientemente grande da massa dos neutrinos poderia chegar a frear a larga expansão e conduzir a um grande colapso.”

Além de uma origem, parece que o Cosmos se contrai e terá um final.

José Manuel Escobero

Autor

Revista Esfinge