A divulgação às vezes um tanto simplista da mecânica quântica levou mal-entendidos à opinião pública. Um deles é a extrapolação na nossa vida diária da probabilidade estatística que rege as leis no mundo atômico e, portanto, uma incerteza no possível cumprimento de ditas leis. Se bem que isto seja certo a nível quântico, na nossa realidade cotidiana os fatos se desencadeiam de outra maneira.

Todas as leis físicas e químicas que desempenham um papel importante na vida dos organismos são de tipo estatístico, mas a partir da cooperação de um número enorme de átomos as leis estatísticas têm comportamento suficientemente exato para podermos lhe outorgar a dignidade de lei.

A precisão aumenta na medida que eleva a quantidade de átomos que intervêm no processo, seguindo a denominada regra da raiz quadrada de x. Por exemplo: Se eu afirmo que um determinado gás, sob determinadas condições de temperatura e pressão, tem certa densidade, e que num dado volume há x moléculas do gás, podemos ter certeza que esta afirmação é inexata, sendo o desvio da ordem de raiz quadrada de x.

Portanto, se o número de moléculas é 100, encontraremos um desvio de 10, ou seja, um erro de 10%. Mas, se o número de moléculas é 1.000.000, o desvio será de 1000 e o erro de 0,1%.

Nosso organismo tem um elevado número de átomos, pois os átomos são muito pequenos. O tamanho real dos átomos, que não possui limites exatos, está entre 1/5000 e 1/2000 da longitude da onda da luz amarela. Esta longitude é igual ao tamanho do menor grão visível com o microscópio. Imaginemos uma gaveta do tamanho dessa longitude de onda; aí caberiam bilhões de átomos.

Assim, embora os átomos estejam afetados individualmente pelos movimentos térmicos e seu comportamento seja estatístico, como nosso gens, neurônios, órgãos e outros componentes vitais têm bilhões de átomos, suas funções se regem por leis estáveis, cujos erros são infinitesimais.

Imaginamos que um organismo que estivesse composto por um número discreto de átomos e fosse sensível ao impacto de um ou alguns poucos átomos com toda certeza não seria capaz de um pensamento ordenado – que é o que caracteriza o ser humano – até o ponto de poder pensar, por exemplo, sobre a idéia de “átomo” e sobre por que os átomos são pequenos. E além do mais, como nossos corpos são muito grandes em comparação com o átomo, não podemos ver, sentir ou ouvir um átomo, e demos graças por isso, porque a quantidade de impactos por nanossegundo que sofreríamos seria uma verdadeira loucura.

Sara Ortiz

Autor

Revista Esfinge