A cultura celta se identifica geograficamente e historicamente com certos países ou lugares que são chamados conjuntamente de “keltia”; ao Noroeste da Espanha, bem como na Irlanda, Inglaterra, Escócia, Bretanha Armoricana, e as colônias em parte descendentes desses povos, como Canadá, EUA e Austrália.

A música celta como um ser vivo está em constante evolução, ao encontra-se relegada à memória humana e dado que em épocas antigas não havia meios para registrá-la, acabou esquecendo em grande parte sua origem ancestral, não só quanto a melodias, mas também quanto à composição de seus típicos instrumentos musicais.

Um passo fundamental que fez ressurgir em nossa história mais recente a música celta foi o fenômeno chamado Renascimento Celta, que aconteceu no início do século XX nas Ilhas Britânicas.

Até então, a música celta, entre outros muitos aspectos desta cultura, estava se esfumaçando. As tradições clássicas não eram transmitidas dos mais velhos a seus descendentes, os quais se mudavam para as grandes cidades em busca de modos de vida mais factíveis e inovadores.

Tudo o que era celta era considerado como “cultura residual”. O único válido era o novo, pois se acreditava que dos antigos ensinamentos não se podia extrair nada válido. No entanto, algumas pessoas conscientes de que o essencial não depende de modas para enriquecer o ser humano promoveram, a partir da Irlanda, o regaste dessa herança ancestral.

Assim surgiu um ponto de partida que se estenderia por todo o território celta: druidas, bardos, Deuses, poesias, épica, canções e instrumentos antigos retomaram seu lugar. A arte renascia e, com ela, muito timidamente, a música.

Ao redor dos anos quarenta foram recompiladas canções ancestrais para difundi-las em estações de rádio dublinesas. Este foi um árduo trabalho, pois, sendo música tradicional, poucos eram músicos instruídos no pentagrama. Como se fosse um costume indireto, os descendentes celtas transmitiam letras e melodias que sabiam de cor, de instrutor a instruído, o que fez com que muitas canções antigas se modificassem ao longo do tempo.

Na década de oitenta é quando a música celta se arraiga e cresce por toda a Europa devido a pequenas associações e pessoas desinteressadas que a fomentam.

Nos anos noventa, a música celta já não é desconhecida. Na Espanha os precursores foram os galegos.

Modas como a New Age deram um enfoque diferente, com sintetizadores, aos sons ancestrais.

Hoje em dia existem inúmeros estilos musicais, que nem sequer são conhecidos popularmente devido ao seu grande número. Eles não costumam durar muito nas listas de moda. Vêm e vão transitoriamente, trazendo um sentido lúdico a seus ouvintes.

A cultura musical clássica celta nos traz, desde milênios atrás, ensinamentos relacionados com a forma com que o ser humano se perguntava acerca dele mesmo e da Natureza que o rodeava.

Esse fato de enriquecermos interiormente e exteriormente com a música é um fato de que se fala em todos os povos antigos, que chegavam a relacionar o som com a coesão que mantem e cria todas as formas de vida. Assim eles se colocavam em contato com a harmonia da Natureza.

No antigo mundo celta havia uma figura encarregada de tal missão: o bardo. Eram poetas e guerreiros. Encarregados de transmitir os conhecimentos sagrados, eram os que abriam as cerimônias, pois se portavam como mediadores entre o mundo do além e este, e tampouco hesitava em fazer uso da espada na batalha. Representavam perante os demais o fogo que fazia a coesão e união do clã, como o fogo no lar.

A música e sua origem sempre tiveram relação com o mágico, com o mundo dos deuses, dos heróis, com realidades superiores. Esta é uma constante na história do homem e da música. A música como Arte é um elemento unificador, pois nos faz sonhar, chorar, rir ou nos animar quando a escutamos sobre a mesma batuta.

Assim entenderam os antigos povos celtas e refletiram em seus instrumentos musicais. Quem sabe, entre todos eles, o que simboliza melhor essa cultura é a harpa.

Até nós chega a imagem da harpa, sempre ligada ao bardo, que efetivamente jamais se separava dela. Mas onde surge realmente esse instrumento? A representação mais antiga que se conhece é datada de 3000 a. C., em esculturas gregas das ilhas Cícladas. Também sabemos que em 600 a. C. os celtas tocavam uma pequena harpa parecida com a lira, que na Irlanda se chama Clairséach.

Entretanto, César, na Guerra das Gálias, relata-nos como os celtas galícios tinham harpas gigantes de até dois metros de altura que colocavam em lugares estratégicos, como em cima dos montes, para amedrontar os romanos invasores com seu som.

Durante centenas de anos, de 1200 a 1500 d. C., os harpistas britânicos em geral desfrutavam do respeito e da admiração de todos, até que em 1603 a Rainha Isabel I da Inglaterra ordenou enforcar todos os harpistas e queimar suas harpas como medida de repressão política durante a invasão inglesa na Irlanda.

O certo é que a harpa que chega até nós sofreu numerosas aventuras e transformações; originalmente, o número de cordas da harpa bárdica oscilava entre 28 e 34, feitas de metal, tocadas com as unhas. Desapareceu faz duzentos anos. As atuais têm cordas de nylon ou de tripa de animal, que lhe dão um som mais atrompetado. É mais larga por baixo para ter maior ressonância.

A harpa também chegou no Sul da América, levada por conquistadores espanhóis. É a harpa chamada Índia.

A partir de 1700 a influência da música veneziana renascentista se deixa sentir em grande medida em todo o mundo.

O violino é chamado fiddle na irlanda. Chegou à Europa Ocidental aproximadamente em 1700, da Itália, guiado pela mesma corrente renascentista que inspirou os harpistas, e passou a ser reconhecido como o instrumento de festa celta por excelência.

A flauta é um dos instrumentos celtas mais antigos. Originalmente era de madeira, com buracos de diversos tamanhos. Isto lhe dava um característico som oco, inclusive se ouvia o ar circular dentro do instrumento.

Foi popularizada em 1800, começaram a construir em metal com 6 buracos e seu som já não é o mesmo.

Quanto à gaita, tampouco está clara a sua origem. Os celtas a adotaram de alguma outra cultura. Há historiadores que nos contam que já se usava o antecessor da gaita em Esparta, à frente dos exércitos, os quais a haviam herdado do Egito, e esta, por sua vez, da Mesopotâmia.

Também passou por Roma este antecessor da gaita; era a tíbia utriculares, destinada ao papel bélico, como a corneta ou clarim, que reunia a cavalaria.

Hoje em dia existem muitos modelos de gaitas. As escocesas são mais sonoras. A irlandesa, chamada Uillean Pipe, é similar, mas tem um peculiar zumbido ou vibração. Na Inglaterra está a chamada Northtumbrian small pipe ou “pequena gaita do Norte”.

Na Bretanha se toca o Binou. Na Espanha, nas regiões celtas (Galícia, Astúrias, Cantábria…) se chama às vezes Cornamusa, e são muito parecidas com as escocesas.

Em Aragon é conhecida a antiga gaita de fole, usada como acompanhamento em bailes tradicionais. Em Huesca elas eram fabricadas pelos pastores com pelo de cabrito e madeira de cerejeira, e como elemento mágico as adornavam com pêlo de cobra.

O instrumento que marca o passo das melodias é o Bodhrán, que significa “surdo” na Irlanda. É um tambor feito de pele de carneiro, que logo se expandiu para outros lugares. Usado antigamente com motivos rituais, costumava acompanhar as gaitas.

Em épocas mais recentes foram acrescentados outros instrumentos, como o acordeom, em 1800. O que é usado geralmente para a música celta é a concertina, que tem teclados de ambos os lados em formato hexagonal.

Também há o banjo, da mesma época. Nasceu na África, mas se desenvolveu na América do Norte junto aos colonos britânicos.

Quanto à percussão, encontramos os tambores gigantes da Irlanda do Norte, os ossos, as colheres…

As últimas inovações em instrumentos musicais, graças aos avanços técnicos, são os sintetizadores, o violino e a gaita elétrica.

Ao longo da história, este rico estilo musical teve épocas de esplendor e de sombras. Sabemos que está presente em diferentes paises e que em cada um deles tem passado por uma evolução diferente. Entretanto, como se estivessem dotados de vida, como as mãos que lhes arrancaram suas melodias, dizem-nos repetidas vezes que a mensagem que passa através de seus corpos tem sido uma mensagem de conhecimento e harmonia para todos.

Claudia Amador

Autor

Revista Esfinge