Escrito por Ivan X. Eskildsen

Tiahuanaco foi um centro cerimonial pré-incaico, localizado 21 km ao sudeste do Lago Titicaca, no território boliviano. Por centenas de anos chamou a atenção de pesquisadores e por milênios atraiu peregrinos de terras muito distantes para mostrar sua devoção às divindades ali representadas. Uns e outros mostram fascinação de maneira diversa por Tiahuanaco, mas todos concordam que seus restos abrem espaço para mais dúvidas a respostas que nos pode proporcionar sobre sua origem e os homens que a habitaram.

O sentido da Vida em Tiahuanaco

Para um Filósofo, o amante da Sabedoria, os restos das velhas civilizações representam uma possibilidade de acessar grandes ensinamentos de vida; são um apoio para a busca de um sentido mais profundo da vida, uma vez que inspiram como prova fidedigna de que existiram homens e mulheres que davam prevalência ao duradouro e sagrado acima do efêmero e profano.

Compreender como pensavam e o que movia os homens das velhas culturas a elaborar seus símbolos hieráticos e a levantar seus monumentos não é tarefa fácil, mas o fruto deste artigo pode iluminar o caminho na direção do próprio autoconhecimento e autoaperfeiçoamento.

“Os museus não devem ser um simples depósito de coisas velhas, acumuladas sem sentido histórico e sem teleologia… São guardiões dos restos de um grande naufrágio. O naufrágio da Humanidade Espiritual. Eles guardam a veracidade daquele mundo mágico e belo, onde todos acreditavam em Deus e o religioso primava em todas as atividades, mesmo nas mais simples e triviais… são um respaldo espiritual, sementes de futuro e inspiração de novos ideais…” – Jorge A. Livraga

Tiahuanaco: um Enigma dos Andes

Tiahuanaco foi um centro cerimonial pré-incaico, localizado 21 km ao sudeste do Lago Titicaca, no território boliviano. Por centenas de anos chamou a atenção de pesquisadores e por milênios atraiu peregrinos de terras muito distantes para mostrar sua devoção às divindades ali representadas. Uns e outros mostram fascinação de maneira diversa por Tiahuanaco, mas todos concordam que seus restos abrem espaço para mais dúvidas a respostas que nos pode proporcionar sobre sua origem e os homens que a habitaram.

Não se conta com fontes escritas e existem poucos restos arqueológicos que sobreviveram à severidade do tempo, à destruição sistemática dos colonizadores e à devastação através dos anos. As tradições e lendas, que o filósofo Mario Roso de Luna recomendava considerar como o “Fóssil-Tradição” que complementaria o “Fóssil-Osso” no trabalho de arqueólogos e paleontólogos, apresentam-se muito vagas e fazendo referência a tempos que a maior parte dos pesquisadores não reconhece como dignos de constar em uma pesquisa séria.

Na sequência, trazemos alguns elementos que permitem nos aproximarmos do Homem de Tiahuanaco, tentando assim retirar, em uma pequena medida, o véu do enigma e compreender um pouco mais sobre a visão que tinham diante da Vida.

Que antiguidade tem Tiahuanaco?

A arqueologia oficial indica que Tiahuanaco provavelmente foi habitada desde 1500 a.C. até seu desaparecimento em 1000 d.C. Reconhecem-se cinco ou talvez até nove extratos arqueológicos; o problema dessa cronologia é que a presença dos extratos implicaria que cada extrato se refere a um período médio de 500 anos, e nesse período teria que haver tempo suficiente para permitir um período de crescimento e um de decadência que levaria a construir a cidade em cima da que tivesse decaído. Quem conhece a magnitude dessas construções pode concluir que só o conjunto monumental que se observa atualmente no parque arqueológico pode ter levado várias centenas de anos para se erguer, se nos atentamos aos métodos convencionais.

Para os Incas, Tiahuanaco era uma cidade sagrada que já iam para realizar oferendas religiosas. Quando Pedro Cieza de León perguntou aos aimarás se as estruturas de Tiahuanaco foram construídas pelos incas, estes riram e afirmaram que tudo o que se podia observar havia “ocorrido subitamente no curso de uma só noite”. Certamente, um dos maiores enigmas que apresenta Tiahuanaco é em relação a como trabalharam suas megalíticas construções, visto que muitos dos blocos utilizados pesam acima de cem toneladas e foram trazidos de várias dezenas de distância. Diante dessa interrogação, a ciência moderna permanece muda, enquanto as tradições locais nos fornecem diferentes possibilidades:

O escritor Bernabé Cobo relata que os habitantes da região lhe narraram uma história que indicava que os grandes blocos de pedra foram transportados pelo ar ao som de um trompete.

Diversas tradições apontam uma raça de gigantes que realizou as construções no curso de uma só noite.

Percy Harrison Fawcett, que foi sócio da Royal Geographical Society de Londres, em seu livro “Exploração Fawcett”, indica que os tiahuanacotas conheciam os segredos de uma planta que crescia nas selvas amazônicas, cuja seiva tinha o poder de abrandar a dura rocha sobre a qual se ia trabalhar, até transformá-la em uma pasta flexível.

Helena Petrovna Blavatsky sugere que as construções ciclópicas de Tiahuanaco, assim como outras do mesmo tipo, foram obras das últimas humanidades de lemures: “os restos mais antigos das construções Ciclópicas foram todas obras das últimas sub-raças dos Lemures; e um Ocultista, portanto, não se surpreende ao saber que as relíquias de pedra encontradas no pequeno pedaço de terra chamado Ilha de Páscoa, pelo capitão Cook, são: ‘muito parecidas com as paredes do templo de Pachacamac, ou as ruínas de Tiahuanaco, no Peru’, e também que elas são de estilo Ciclope.” Ao contrário, o Glossário Teosófico editado pelo teósofo Gottfried de Purucker menciona que Tiahuanaco se trata de uma civilização de origem atlante, que teria herdado fragmentos da tradição lemur.

Qualquer que seja o caso, abundam as tradições locais sobre homens gigantes que realizaram as grandes construções de área. Na crônica “Copacabana dos Incas”, de Fray Baltasar de Salas, refere-se às tradições sobre os “Chullpas” ou gigantes que existiram antes que surgisse o Lago Titicaca; ele diz que com suas guerras e matanças levaram Deus a “desgastar a face da Terra com Água Universal”.

A história de Tiahuanaco aparece por toda parte ligada a do Lago Titicaca. A história de ambos é a proto-história andina. Em “Soma e Narração dos Incas”, Juan de Betanzos relata uma tradição que indica que Ticci Viracocha surgiu da laguna que está onde hoje está Tiahuanaco e dali criou o sol, a lua e os seres humanos. Ou seja, ainda que boa parte das tradições situe o gênesis andino na Ilha do Sol, essa o situa em Tiahuanaco, o que não deixa de ser interessante se se considera que diversos pesquisadores afirmam que Tiahuanaco era um velho porto do Lago Titicaca e que o nível do lago costumava estar 135 pés mais alto.

Também relata o escritor Bernabé Cobo que, depois que cessou o Dilúvio, o Criador formou de barro, em Tiahuanaco, “as nações todas que há nesta terra… que lhes mandou sumirem debaixo da terra… para que dali fossem sair para as partes e lugares que ele lhes mandasse.” Curiosamente, também existem diversas tradições antigas que afirmam que Tiahuanaco, a Ilha do Sol no Lago Titicaca, e Cusco estavam conectadas por redes de túneis subterrâneos. Hoje existem várias entradas de túneis antigos próximo de Sacsayhuamán e Qengo, mas costumam estar fechados ao passo de cinco ou dez metros.

Além disso, as tradições dos nativos ao redor do lago abundam de referências a cidades submergidas ao fundo do Lago Titicaca, diversas expedições afirmam ter encontrado restos subaquáticos.  Desde 1956, o norte americano William Mardoff descreveu detalhes de uma cidade de titãs submergida e semicoberta pelo lodo e algas. A expedição do argentino Ramón Avellaneda, em 1968, aponta a descoberta de enormes pedras monolíticas, agrupadas entre si formando muralhas, similares as de Sacsahuamán e caminhos perfeitamente pavimentados com enormes placas de pedra. Comentários similares a esse último resultaram de outra expedição em 1979, a cargo do pesquisador Hugo Boero Rojo, enquanto se filmava o filme “O Lago Sagrado”. Mais recentemente, em publicações da BBCMundo.com, relata-se o descobrimento de escadarias, rampas e muros pré-incaicos debaixo das águas do Lago Titicaca.

Somando às tradições de gigantes da área, Garcilaso de La Vega menciona, no Livro Nono dos “Comentários Reais dos Incas”, que os naturais de Passau relatavam uma tradição de seus antepassados de muitos séculos atrás, sobre uns gigantes que chegaram por mar e desembarcaram na ponta de Santa Elena (hoje Equador):

Contam os nativos, por relatos que ouviram de seus pais, que vieram pelo mar em jangadas de bambu, como grandes barcos, uns homens tão grandes, que um deles tinha do joelho para baixo o tamanho de um homem comum de boa estatura, e que seus membros se adequavam com a grandeza de seus corpos disformes, que era coisa monstruosa ver as cabeças, como eram grandes, e os cabelos, que lhes chegavam às costas. Os olhos mostravam que eram tão grandes como pequenos pratos; afirmam que não tinham barba e que alguns deles vestiam-se com peles de animais, e outros com a roupa que lhes deu a natureza, e que não traziam mulheres consigo…como não achavam água, para remediar a falta que dela sentiam, faziam uns poços fundíssimos, obra, por certo, digna de memória, feita por tão fortíssimos homens como se presume que eram aqueles, pois era tanta sua imponência. E cavaram esses poços em rocha viva, até que eles encontraram água, e depois os alinharam da rocha até o seu topo, de tal maneira que durou muito tempo… todo o mantimento que encontravam na região da terra que eles podiam pisar destruíam e comiam, tanto que dizem que um deles comia mais alimento do que cinquenta homens nativos daquela terra; e como não bastava a comida que conseguiam para sustentar-se, matavam muito pescado no mar, com suas redes e aparelhos que tinham… Chegaram causando grande ódio nos nativos, porque utilizavam suas mulheres e as matavam, e a eles também matavam por outros motivos… 

Passados alguns anos, estando ainda esses gigantes nessa região, como não tinham mulheres e as nativas não os aceitavam por sua estatura muito grande, ou porque era um vício comum entre eles, por conselho e provocação do maldito demônio, empregavam uns com os outros o pecado nefasto da sodomia, tão grande e horrendo, o que cometiam pública e descobertamente, sem temor de Deus e pouca vergonha de si mesmos; e afirmam todos os nativos que Deus, Nosso Senhor, não sendo usado para esconder pecado tão mau, enviou-lhes o castigo conforme a feiura do pecado; e assim dizem que, estando todos juntos envolvidos em sua maldita sodomia, veio fogo do céu, temeroso e muito assustador, fazendo grande ruído, por meio do qual saiu um anjo resplandecente com uma espada cortante e muito brilhante, com a qual, de um só golpe, matou a todos, e o fogo os consumiu, que não sobrou senão alguns ossos e caveiras, que por memória do castigo quis Deus que ficassem sem ser consumidos pelo fogo.

Isso contam dos gigantes, o que acreditamos que aconteceu porque, nessa região que citam, foram encontrados e ainda se encontram ossos grandíssimos, e eu escutei espanhóis que viram pedaço de dente que julgavam que estava inteiro e pesava mais de meia libra de 36 onças; e também que haviam visto outro pedaço de osso de uma canela, que é coisa admirável contar quão grande era, e o que comprova o ocorrido.

Outras descobertas que nos dão uma ideia ao menos da antiguidade mínima que poderia ter Tiahuanaco têm relação com referências a diversos animais pré-históricos. A Porta do Sol mostra em seus glifos a imagem de um animal que se assemelha a um elefante. Segundo Graham Hancock, em sua obra “Pegadas dos Deuses”, existiu nos Andes uma espécie chamada Cuvieronius, que se assemelha muito com a imagem da Porta do Sol, que se extinguiu cerca de 10.000 a.C.

Além disso, em sua obra “Tiahuanaco, Berço do Homem Americano”, Posnansky afirma ter encontrado um crâneo fóssil a uma profundidade de quatro metros junto à pirâmide de Akapana em Tiahuanaco; na mesma camada, afirma ter encontrado restos de ossos de espécies de animais extintos. O pesquisador Guillermo Lange aponta que, posteriormente, especialistas zoólogos determinaram que esses restos pertenciam à espécie do Toxodonte, o qual viveu no período Plioceno, há 25 milhões de anos, na Era Cenozoica, em meio a um clima favorável de abundante vegetação. Ainda que a espécie do Toxodonte acredita-se ter desaparecido da região andina há mais de 12.000 anos, encontra-se representada em diversas figuras tiahuanacotas.

Tudo isso parece apontar para uma antiguidade muito anterior à oficial aceita e as diversas provas apontam que se trata de uma civilização cujas primeiras expressões antecederam o levantamento dos Andes e a criação do Lago Titicaca, possivelmente em um tempo que representava um clima mais favorável que o que atualmente se mostra diante do pesquisador que visita essa árida região.

O sentido da Vida através do Simbolismo Teológico Tiahuanacota

É evidente que as construções, monolitos e símbolos de Tiahuanaco são de natureza muito diferente das posteriores da civilização inca. Novamente, a ausência de documentos escritos dificulta sua interpretação, mas os relacionando com as tradições e símbolos de outras culturas nos permite inteligir a trama simbólica e a mensagem que evoca.

Um nome anterior que recebia Tiahuanaco era Taypikala, que na língua aimará significa “a pedra do centro”, fazendo referência a um centro sagrado, a um “umbigo”, como igualmente se relacionam de distintas maneiras outros centros sagrados como Cusco, Potala e Delfos. Assim, os símbolos de Tiahuanaco refletem um enfoque teológico da vida dirigido à realização humana ou seu contato com os mais profundos Mistérios do homem e o universo.

No centro cerimonial de Tiahuanaco, como no resto do mundo antigo, a pirâmide recebeu um lugar importante; em uma interpretação, relaciona-se a pirâmide com o avanço evolutivo da Vida desde a base do mundo manifestado até a cúspide do mundo divino. Além disso, a planta da estrutura da Pirâmide de Akapana é semelhante à metade da cruz andina, um símbolo muito repetido na produção simbólica de Tiahuanaco.

a) A porta do Sol

Pode-se considerar que na Porta do Sol se vê refletida a síntese do sentido de centro cerimonial tiahuanacota. Com dimensões de três metros de largura por mais de dois metros de altura, pesa dez toneladas e está esculpida em uma só peça de andesita.

Muitos afirmam que a figura central do monolito representa a deidade pan-andina Virakocha, outros preferem relacioná-la de maneira mais simples com uma deidade solar. Da cabeça desse personagem lançam-se 24 raios que terminam em círculos ou cabeças de puma, e seus olhos são representados terminando em duas cabeças de puma com pontos que descem semelhantes a lágrimas. Sustenta dois cetros de poder que terminam em cabeças de condor. Aparece ricamente adornado com diversas cabeças que lhe contornam: umas antropomorfas e outras cabeças de puma. A personagem está pousada sobre uma pirâmide escalonada em cujo coração aparece uma figura que lembra uma lagarta ou larva e que mostra uma cabeça de puma.

Para ambos os lados da figura central aparecem três fileiras de seres alados (são 48 no total) que parecem ajoelhar-se em direção à imagem solar central: desses, 32 têm cabeça humana e 16 têm cabeça de condor. Todos sustentam cetros de poder, com coroas e representações de condor e puma ao redor da mesma coroa e distribuídas no corpo desses seres.

Na fila interior do friso, aparecem onze máscaras solares rodeadas de um “meandro” com terminações em cabeça de condor.

Existem várias teorias sobre o que isso pode simbolizar. Estas são algumas delas:

Visto que o Sol era considerado um símbolo da Divindade por muitas civilizações antigas, poderia se dizer que a imagem central do friso representa a ideia do Sol Espiritual, ou Logos Solar, que sintetiza a conquista da espiritualidade do Ser Humano; de tal modo, quem cruzava a Porta do Sol era o iniciado nos Mistérios que havia potencializado suas características internas, seu Deus interior.

Múltiplas figuras de puma e condor fazem referência a dois símbolos amplamente representados na América pré-colombiana. O condor é o equivalente da águia em outras culturas, onde sua constituição robusta e garras fortes evocam grande poder, assim como sua visão extremamente aguda reflete uma semelhança com a visão espiritual. O puma ou, segundo outros, o jaguar, também é representado amplamente na América pré-colombiana e simboliza o aspecto oculto do Sol; assim como o Sol físico impulsiona a Vida física de nosso planeta e sistema solar, os antigos acreditavam que existia um Sol espiritual que igualmente impulsiona a Vida espiritual de nosso sistema solar. Por outro lado, os atributos do puma e do condor refletem o despertar das qualidades que esses símbolos evocam.

Nas velhas tradições e símbolos, o cetro de poder se encontrava sempre nas mãos do sábio ou rei e, portanto, era símbolo daquele que havia despertado o poder interno e, por isso, podia exercer poder sobre os demais.

O fato de a imagem central estar pousada sobre uma pirâmide evoca a ideia de que superou os degraus de evolução espiritual e aqui parece estar representada por uma lagarta com cabeça de puma ou um embrião de puma. As terminações de seus olhos em duas cabeças de puma evocam a ideia de ter alcançado uma visão de puma ou do Sol espiritual. Os círculos que aparentam lágrimas evocam a ideia de que o homem que superou os degraus de evolução ainda sente profunda dor pelo resto dos seres que ainda sofrem no ciclo vicioso da ignorância, que lhes leva à dor. Faz recordar aquela passagem de A Voz do Silêncio: “Fazes com que tua alma preste atenção a todo grito de dor, assim como o lótus desvenda teu coração para absorver os raios de sol matutino. Não permitas que o sol ardente seque uma só lágrima de dor antes que tu a tenhas enxugado nos olhos daquele que sofre”. Os seres alados que rodeiam a imagem central parecem representar espécies de gênios ou espíritos alados que rendem tributo e prestam serviço àquele que despertou a divindade interior. Diz a Voz do Silêncio: “Ajuda a Natureza e trabalha com ela, assim a Natureza te considerará como um de seus criadores e te prestará obediência.” Esses seres também refletem em si os atributos do poder espiritual: cetros, cabeças de condor e de puma etc.

Quanto à fila inferior do friso, citamos a interpretação que dá Arturo Posnansky, quando se refere a um calendário com onze meses representados nas máscaras solares na parte interior do “meandro”, e a imagem central do friso representa o mês de setembro, o mês da primavera para o hemisfério sul.

Adicionalmente, pesquisadores da Universidade de Moscou demonstraram que a Porta do Sol reflete um calendário venusiano. O planeta Vênus mostra um lugar predominante, não só em outros panteões da América pré-colombiana (Quetzalcoatl, no México), mas que a tradição esotérica afirma existir uma relação importante entre os senhores de Vênus e os seres humanos.

b) Monolito Ponce

Também dentro do Templo de Kalasasaya encontra-se o chamado monolito Ponce, que mede 3.7 metros de altura, elaborado de pedra andesita, e mostra uma personagem ricamente adornada e decorada com diversos símbolos.

A cabeça está adornada com uma coroa de seres alados ao estilo da Porta do Sol e os olhos da personagem mostram igualmente terminações em cabeças de puma e condor (o monolito Fraile igualmente mostra esses atributos). Sustenta contra seu peito dois kerus ou vasos cerimoniais adornados com diversas imagens de peixes. Na cintura se mostra uma faixa com imagens de cubos do qual saem cabeças de condor ou de peixe. As pernas estão cobertas por círculos duplos.

Da parte superior da coroa descem uma espécie de tranças com seis segmentos, mais um sétimo, na parte inferior, que representa uma cabeça de peixe. Na parte central das costas figura uma personagem similar à principal da Porta do Sol, ricamente adornada com imagens de peixe, puma, condor, com dois cetros de poder, ao mesmo tempo que rodeada por seres alados que igualmente se encontram ajoelhados com cetros de poder e tendo imagens de peixe, puma e condor.

Os símbolos que refletem esse monolito se observam na Porta do Sol e se replicam ao longo da produção simbólica tiahuanacota, mostrando uma unidade em sua mensagem. Nesse caso, a personagem do monolito Ponce parece representar um sacerdote ou candidato que foi merecedor de atravessar a Porta do Sol, por isso reflete em si os atributos de poder da Divindade:

  • Os seres alados em sua coroa e a imagem no centro de suas costas parecem com a imagem solar da Porta do Sol.
  • Os kerus ou vasos cerimoniais se sustentam semelhantes a oferendas.
  • Os olhos com terminações em cabeças de condor e puma parecem indicar o despertar de uma visão espiritual ou uma visão dos planos celestes no caso da figura do condor.
  • As imagens de quadrado no cinturão do qual saem cabeças de peixe e de condor parecem evocar a ideia da matéria primordial que se assemelha, por um lado, com as águas primordiais ou genesíacas (peixe) e, por outro lado, com a matéria primordial que contém em si o poder espiritual (condor).

c) Pumas e Chacha-pumas

Acima mencionamos o caráter sagrado que tinha a imagem do puma ao longo da América pré-colombiana. Além de sua representação por si só para evocar a meta divina que se propõe alcançar, também se mostram imagens dos chamados Chacha-pumas ou homens-pumas.

Uma obra de importância simbólica mostra uma personagem com máscara de puma e uma cabeça humana entre as mãos. Recordando o significado do puma, pensa-se que essa imagem evocaria a ideia do homem que superou sua humanidade inferior, substituindo-a por uma nova realidade divina, através da máscara que reflete o poder espiritual do puma.

Outra imagem que contempla a anterior mostra uma personagem identificada como “sacrificador”, com máscara de felino, sustentando em uma mão um machado e na outra uma cabeça humana. A imagem anterior do homem que despertou em si a realidade do puma e portanto substituiu sua cabeça humana pela cabeça de puma, agrega-se nessa imagem a ideia de que para despertar a realidade do Chacha-puma ou homem-puma, o homem deve sacrificar sua humanidade inferior com o machado. É uma realidade representada em diversas tradições de que o nascimento do homem espiritual está subordinado a uma superação do homem inferior, das paixões e dos instintos inferiores. Também o machado se relaciona, em diversas tradições, com o instrumento da Vontade que permitirá aniquilar finalmente a esse eu inferior.

Mais informações em:

1. Acosta, Joseph de. “Historia Natural y Moral de las Indias. México: Fondo de Cultura

Económica.

2. Arancibia, Arturo. “Tiwanaku, Stelas or monoliths; esoteric iconography and

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3. Betanzos, Juan de. “Suma y Narración de los Incas: Tomo I.” Biblioteca Hispano

Ultramarina, 1860.

4. Blavatsky, Helena Petrovna. “La Doctrina Secreta: Tomo III”. Buenos Aires: 1956.

5. Cieza de León, Pedro. “Crónica del Perú.” Madrid: Imprenta de Manuel Ginés

Hernández, 1880.

6. Cobo, Bernabé. “Historia del Nuevo Mundo: Tomo III”. Imprenta de E. RASCO, 1892.

7. Garcilaso de la Venga, Inca. “Comentarios Reales de los Incas.” Lima: Universidad

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8. Gilardi, Angela y Fígares, Fernando. “Perú: Manual de Simbolismo y Arqueología.”

Madrid: Editorial Nueva Acrópolis, 1989.

9. Hancock, Graham. “Fingerprints of the Gods.” New York: Three Rivers Press, 1995.

10. Lange, Guillermo. “El mensaje secreto de los símbolos de Tiahuanaco y del lago

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11. Livraga, Jorge Ángel. “Magia, Ciencia y Religión para el tercer milenio. Antiguas

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12. Pratt, David. “Lost Civilizations of the Andes.” http://davidpratt.info/andes1.htm

13. Purucker, Gottfried de. “Encyclopedic Theosophical Glossary: a resource on

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14. Salas, Baltasar de. “Copacabana de los Incas.” La Paz: J. Viscarra F., 1901.

15. “Simbología Teológica en América.” Madrid: Editorial Nueva Acrópolis, 1976.

16. Tiwanaku: Señores del Lago Sagrado. Santiago: Banco Santiago, 2000.

Autor

Revista Esfinge