Confúcio é uma figura chave na história do pensamento universal. A ele deve-se a introdução do humanismo na sociedade chinesa, um século antes que Sócrates começasse a falar sobre ética e moral na Grécia Antiga. Diante da perda de valores da sociedade atual, mostra-se como um exemplo a seguir, tanto em seu comportamento pessoal como em sua atuação como governante.

“Onde há justiça não há pobreza” (Kung-Fú-Tsé)

Em meio à era feudal, o antigo Império Celestial foi decomposto em uma enorme variedade de estados que guerreavam continuamente entre si e onde a corrupção, os abusos, a desordem social e a miséria estavam sempre presentes. Surge este curioso personagem, cujos ensinamentos irão transcender o tempo, e que irá converter-se no eixo central da vida da sociedade chinesa ao longo de quase 2.500 anos. Não foi em vão que passou a ser considerado por seus compatriotas o maior sábio de todos os tempos.

Suas maiores contribuições foram: coletar para a posteridade o melhor dos textos e tradições antigas e, como seu objetivo principal era a educação, transmitir esse conhecimento para a formação ética de seus discípulos, criando a primeira escola aberta a todos (antes dela, pessoas comuns não tinham direito à educação).

Foi o único ser humano na história chinesa respeitado por imperadores e pessoas simples como um verdadeiro sábio e educador. Confúcio foi e continua sendo um modelo de virtudes para todos os que buscam referências para viver em harmonia.

Vida e ensinamentos:

Como ocorre com todos os grandes personagens da Antiguidade, a vida de Confúcio apresenta muitos pontos ocultos que passaram a formar parte da lenda, dado que sua biografia mais antiga data quase quatro séculos após seu nascimento.

É aceito que tenha nascido no ano de 551 a. C. no estado de Lu. Perdeu seu pai aos três anos de idade, deixando à sua mãe na mais mísera pobreza. Sobre sua educação, os poucos dados que temos afirmam que foi um autodidata. Seu discípulo Tzu King afirmou que não teve necessidade de professores. No entanto, é provável que tenha tido acesso a textos que lhe permitiram adquirir uma grande quantidade de conhecimento, como ele demonstraria mais tarde.

Suas habilidades inatas o levaram a ocupar diferentes cargos no governo, como a de inspetor de grãos aos dezessete anos. Aos dezenove anos casou-se, tendo um filho e uma filha deste casamento. Aos 21 anos, foi nomeado inspetor de gado e campos.

Foi convidado a se tornar um alto dignitário do Estado, mas sua mãe faleceu, com apenas quarenta anos, e Confúcio se retirou da vida ativa, para lamentar por 27 meses (como tradição prescrita para funcionários públicos). Desta vez, investindo em estudo, música e reflexão, marcou uma nova direção em sua vida, pois, ao final, decidiu dedicar-se à sua profunda vocação, iniciando assim sua verdadeira vida como professor.

Criou uma escola de caráter humanista, onde a formação do caráter de seus discípulos era sua principal preocupação. Para eles, ensinava história, ciência política, música, poesia e sobretudo, ética.

A história era uma de suas principais paixões, porque considerava que “nela encontramos exemplos de personagens dignos de imitar, e de comportamentos indignos que devem ser evitados.”

A respeito da política, dizia que governar é “servir de exemplo” já que “o povo imita o que fazem os governantes”. E ainda diria: “os antigos governantes acreditavam que amar a seus povos era o princípio essencial de seu governo, e seguir com retidão as mais elevadas regras de conduta, o princípio essencial que regia seus atos de governo sobre o povo que amavam.”

Quanto à música, esforçou-se em iniciar uma reforma da mesma, para que fosse adequada para expressar e para estimular a harmonia interna do espírito, dado que “um espírito harmônico é a chave para que a conduta seja também harmônica”.

Sobre a poesia dizia que era “a que desperta a alma”.

A ética era para ele “fazer que nossos sentimentos sejam conduzidos pela razão e não arrastados pela paixão humana”, dado que esta última “é a que nos faz perder o entendimento e a retidão de nossa alma”.

Um dos momentos mais importantes de sua vida foi a viagem a Lo, antiga capital do Império Celeste (que ele tanto admirava e cujos governantes eram considerados “filhos do Céu”). A visão de suas avenidas, suas construções e monumentos, ao mesmo tempo que seus quadros e suas estátuas, fizeram-no reviver um antigo passado de esplendor que ele pensava em recuperar para seu povo. Nesta viagem ocorreu um encontro excepcional com Lao Tsé, um outro grande sábio chinês, de quem obteve algumas influências decisivas para sua vida.

Durante vinte anos, o mestre viajava, ensinando e pondo-se em contato com diferentes príncipes, em cujas rivalidades intervia, solicitado por eles. Sua fama de homem sábio chegou a tal ponto que foi convidado pelo príncipe de Lu para ocupar o cargo de governador de uma cidade, e transcorrido pouco tempo, de ministro de obras públicas, e mais tarde ministro da justiça, o cargo de maior responsabilidade do Estado (pois não estava encarregado apenas do direito no sentido estrito, mas sim de toda a administração).

Trouxe tantas melhorias para seu país que os estados vizinhos, temerosos da influência que o sucesso de Confúcio pudesse ter sobre seu povo, decidiram neutralizá-lo. O ataque foi dirigido ao príncipe de Lu (já que eles sabiam que Confúcio era incorruptível): enviaram-no de presente as oitenta melhores e mais belas dançarinas, lideradas pelos mais belos carros e cavalos. Dessa maneira, conseguiram fazer com que o príncipe perdesse o controle de seus deveres e, a partir daquele momento, em vez de ouvir e aceitar os conselhos do mestre, como havia feito até então, dedicou-se ao seu novo e seleto harém, esquecendo sua missão como governante.

Confúcio, desalentado e com o coração partido, deixou seu estado natal e por catorze anos viajou por diferentes regiões da China, instruindo príncipes e mendigos, jovens e anciãos.

Possuía setenta anos quando foi formalmente convidado pelo novo príncipe a regressar a seu país. Lá permaneceu até sua morte, três anos mais tarde. Durante este curto período dedicou-se a concluir a obra que imortalizaria seu nome: a recopilação, redação e edição dos chamados Cinco livros clássicos, destinados como fonte de inspiração a futuras gerações.

Seu trabalho foi continuado por seus discípulos, que recolheriam seus ensinamentos e os transmitiriam para a posteridade, conforme ensinado por seu mestre. Em uma ocasião, surpreendido por estes, contemplando o curso de um rio, disse-lhes: “Existe uma relação estreita entre as águas e a doutrina. As águas correm incessantemente; correm durante o dia, correm à noite, até que todos se reúnem no seio do vasto mar. Desde sábios governantes Yao e Schun (fundadores míticos do Império Celestial), a sã doutrina correu sem interrupção até nós; vamos cuidar também para transmiti-la aos nossos sucessores, que, seguindo o nosso exemplo, o transmitirão aos nossos descendentes, e assim por diante até o fim dos séculos “.

A doutrina ou ensinamento que Confúcio se empenhou para transmitir baseava-se no desenvolvimento ético do ser humano, sem vãos misticismos, para se concentrar totalmente no aqui e agora. Quando questionado uma vez sobre a morte, ele respondeu: “Se não somos capazes de entender a vida, por que nos preocuparmos com a morte?”.

Todo o seu trabalho pedagógico sobre o indivíduo busca uma irmandade e harmonia com o resto dos seres, de modo que para ele não haja diferença entre ética e política, uma vez que a ordem política é fruto de uma ordem ética, alcançada através de uma educação que promova o desenvolvimento e a evolução pessoal. Em certa ocasião, um discípulo perguntou a Confúcio: “Mestre, qual é a melhor maneira de servir aos deuses?” E o mestre respondeu: “Antes de servir aos deuses, certifique-se de servir os humanos ao seu redor, torná-los nobres, corajosos, honestos, justos e virtuosos; e depois de fazê-lo, dedique-se aos deuses”.

Assim, em nenhum momento negou a existência da divindade, mas entendeu que, se não somos capazes de amar nosso próximo, não há sentido em tentar alcançar o amor divino.

O mundo de hoje não é muito diferente do que Confúcio conhecia: falta de ética no ser humano, falta de justiça na sociedade, falta de fraternidade entre as pessoas, falta de harmonia e união entre os povos. Talvez seja o momento de levar em conta os ensinamentos desse grande sábio.

Escrito por Ricardo Saura

Autor

Hinaldo Breguez