Por Hinaldo Breguez

Prof. Nova Acrópole Juiz de Fora – MG

Existe uma parte da consciência humana responsável pela construção da nossa imaginação. Uma dimensão simbólica, capaz de criar infinitas formas de representações da vida. Um verdadeiro patrimônio imaginário, que segundo Jean Piaget e sua teoria dos estágios de desenvolvimento da criança, a construção desse pensamento simbólico surge no ser humano antes mesmo que o seu pensamento racional comece a manifestar sua existência. Essa teoria clássica da educação demonstra que a primeira forma de pensamento que geramos na vida não é racional. Primeiro simbolizamos e somente depois raciocinamos. Quando bebês não conseguimos gerar definições ou pensar de imediato. Iniciamos o nosso contato com o mundo físico, captando informações com o corpo através das sensações e emoções, como uma preparação do estágio do pensamento simbólico, para somente depois começarmos a colocar para funcionar o nosso pensamento lógico racional. Todo ser humano independente de sua crença, sua nacionalidade ou condição social, carrega dentro de si este universo de possibilidades construídos individualmente por imagens.

Somos dotados de pelo menos duas formas de pensamento lógico, por mais que uma delas tenha sido praticamente esquecida de ser introduzida em nosso sistema de crenças. Uma lógica de exclusão e outra de integração. Uma lógica racional e uma lógica simbólica. Quando precisamos conceituar algo, gerar definições ou quantificar, isso é possível pela natureza do pensamento racional, que divide e classifica para podermos entender. Para definir o que é um livro o isolamos de todas as outras coisas que existem e assim afirmamos que um violino não é um livro e nem uma maçã ou uma bicicleta. Entendemos que o número cinco é diferente do sete. E por isso o separamos. A razão precisa dividir para os seres humanos conseguirem enxergar. Seria impossível construir tudo o que a humanidade já alcançou sem essa forma de pensamento. A questão é que o pensamento racional também possui suas limitações e por isso pode se completar com o pensamento simbólico, para ajudar inclusive a não cairmos em uma visão estritamente materialista e utilitária da existência, correndo o risco de cometermos graves erros de classificação. Por natureza o pensamento racional divide e o pensamento simbólico unifica.

Com esta lógica racional ou conceitual, também podemos cometer erros intelectuais importantes. Gerar premissas falsas, reducionistas e dogmáticas. Sendo os desafios do pensamento simbólico evitar as fantasias e os fanatismos em todas as áreas. Nada é totalmente branco ou preto. Seria simples demais se a vida, as circunstâncias e as pessoas fossem assim – uma coisa só. Todo ser humano pode acumular qualidades e defeitos, virtudes e vícios. Somos os dois. Ajudaria muito se entendêssemos melhor como somos constituídos. Todos os dias pessoas são classificadas como ruins por uma única fala ou gesto. Como se essa atitude tivesse apagado todo o seu histórico de vida. Décadas de existência, de experiências, excluídas em poucos segundos. Reduzir uma vida inteira a um único momento exige um poder de síntese que nenhum ser humano possui.

Muitas respostas que precisamos só podem ser reveladas pelo pensamento simbólico que traz a lógica da integração dos contrários. Essa é uma das funções do símbolo e da linguagem simbólica. Promover a lógica da inclusão. Uma forma de pensamento que não precisa sofrer das mesmas limitações da lógica racional. Cada pessoa no mundo guarda dentro de si um sistema de crenças e representações. Neste sistema armazenamos tudo aquilo que acreditamos ser certo e errado, que consideramos possível ou impossível, nossas definições do que entendemos justo, injusto, fácil, difícil e todas as outras posições oficiais que carregamos diante da existência. Antes de tomarmos qualquer decisão na vida, acionamos mesmo que instintivamente esse sistema de crenças para validar aquilo que queremos fazer. E talvez você esteja se perguntando o porquê ser um sistema de representações também. É que o nosso imaginário, o nosso pensamento simbólico, é construído justamente em cima do nosso próprio sistema de crenças. E isso guarda um significado muito importante para o ser humano, pois em razão disso ninguém é capaz de sonhar aquilo que não acredita. Ninguém alimenta dentro de si um sonho que considera ser impossível. Você constrói a sua visão de futuro fundamentada naquilo que para você é real.

Educação significa transformar as suas representações simbólicas do presente, do passado e do futuro. Mudar de dentro para fora. Na medida em que desligamos nossa imaginação, pouco a pouco vamos deixando de sonhar. Ficamos satisfeitos com as imagens prontas que recebemos de todos os lados, pois não conseguimos mais gerar nossas próprias imagens. Assumimos um estilo de vida ‘‘psicologicamente industrial’’ quando só conseguimos consumir aquilo que já vem pronto. Repetimos o que lemos ou o que escutamos, sem nos dar o trabalho de refletir a respeito. Aceitamos tudo com muita facilidade. Nos tornamos reféns do pensamento racional, mas agora sem conseguir criar uma perspectiva de um futuro novo e melhor, pois o nosso pensamento simbólico foi desligado e permanece adormecido. Devemos então reativar essa lógica simbólica sobre a vida. Não basta recitar os grandes clássicos, temos que vivê-los, gerar nossas próprias experiências nos imaginando dentro deles. Aceitar que em todo ser humano falta algo e que por isso juntos podemos nos completar. Como certa vez disse o professor Jorge Angel Livraga: ‘‘o que temos de tocar não é o céu, mas o coração do ser humano e chegar de novo a uma convivência básica e humana.’’ Sonhe com isso.

Bibliografia:

– Fernando Schwarz, O sagrado camuflado, a crise simbólica do mundo atual, Belo Horizonte, 2017

– Fernando Schwarz, Mitos, ritos e símbolos, antropologia do sagrado, Lisboa, 2018

Autor

Hinaldo Breguez