Ma. Ángeles Fernández

As tabuletas enceradas em uma mão, o cálamo pronto na outra. Seleciono, escolho entre tantas idéias que se amontoam em minha mente. Há tantas coisas formosas sobre as quais escrever…

Talvez escreva uma poesia. Talvez concretize em meus versos todo o amor que transborda do meu coração, a admiração que produz em mim a beleza, a dor de não poder abraçar-te hoje. Busco as palavras mais sugestivas, as mais ressonantes, as mais doces. As que tenham o acento melhor colocado, as sílabas alternadas, as vogais longas e curtas.

Ou não. Talvez não. Talvez só deixe fluir meus pensamentos, como flui o rio da beleza entre as árvores do meu mundo. Escrever, só escrever, pelo prazer de que não escapem meus sentimentos, meus desejos mais ocultos, mais meus. Talvez logo o apague, para que sigam sendo meu segredo.

Vou escrever…

Escreverei que te amo. Que Eros desça sobre minha alma unindo-me a ti com o abraço de suas asas. Que o pequeno Cupido ria de mim detrás do seu arco. Que Afrodite seja minha Senhora e me salpique com a espuma dos mares. Que Pan me tome pela mão e me leve para seus bosques e acompanhe com sua flauta minhas canções.

Escreverei que o mundo é formoso, que nada nele falta nem sobra. Que a simples folha de uma flor é mais bela que a mais bela das jóias de uma rainha.

Escreverei que te vi hoje e meu coração foi lira tangida pelo vento, e meus olhos espelhos que refletiam teu rosto tão amado. Que me falou e tua voz foi o sino da glória em meus ouvidos.

Procurarei palavras que te agradem, para quando as leias. Deixarei minhas tabuletas junto ao teu leito, para que as encontres pela manhã. Farei de ti partícipe e depositário dos meus sonhos.

Vou escrever…

Não poderia viver sem fazê-lo. Não poderia guardar para mim as palavras. Não poderia deixar de voar nelas, impulsionada pela sua cadência.

Dizem que sou Safo. Talvez. Talvez seja só a encarnação das palavras. Da poesia.

Autor

Revista Esfinge