A aparição de um mercado mundial de artigos supérfluos começou a mover um capital que desembocou no consumismo e no mercantilismo de nossos dias.

Juan Prades

Tal como aconteceu com outros ramos do conhecimento, também a ciência econômica teve sua fase de grande desenvolvimento e de concepção sistemática, sobretudo em meados do século XVIII. Contudo, quando se trata de fixar as características da evolução do pensamento econômico, percebe-se que desde a antiguidade dominaram duas correntes fundamentais e opostas entre si. Por um lado, a construção de sistemas ideais e por outro, a análise objetiva da atividade econômica.

Platão, na República, se esforça para delinear o projeto de uma sociedade ideal, baseada em um sistema hierárquico: em cima se encontram os filósofos, na qualidade de governantes, no meio se encontram os auxiliares ou soldados, na parte inferior da escala os agricultores e os artesãos. Platão imagina esta divisão de atividades como o meio de libertar as classes superiores (magistrados e guerreiros) da servidão das posses e da riqueza, assim como do espírito de lucro e da inveja. Estas classes superiores têm como missão consagrar-se ao serviço da comunidade.

Aristóteles se concentra mais na análise dos fatos, dos intercâmbios e das funções da moeda. Aos olhos de Aristóteles, esta análise era justificada pela busca de uma definição do preço justo e pela condenação do monopólio.

Os romanos mostravam certo sentimento de reprovação da atividade econômica, que consideravam indigna de um cidadão. Os escritos romanos mais importantes do ponto de vista econômico tratavam principalmente de problemas práticos (agricultura, comércio interno, intercâmbios internacionais). Ao contrário, davam grande importância ao Direito (contrato, direito de propriedade) e graças a isto exerceram grande influência na vida econômica.

O pensamento econômico não apresentou progresso algum no período compreendido entre a decadência romana e o século XII. Foram unicamente os teólogos e moralistas que se ocuparam desta matéria através das suas preocupações morais, filosóficas ou espirituais sobre a significação dos fenômenos econômicos. A economia aparecia ligada a considerações éticas.

Os teólogos, encabeçados por santo Tomás de Aquino e Luis de Molina, se situam em uma posição muito clara a respeito de determinados problemas econômicos, fazendo depender a solução destes da concepção cristã da existência.

A pujança da burguesia cidadã no século XIV, os grandes inventos e descobrimentos, a afluência de metais preciosos procedentes das colônias americanas, a revolução na ordem intelectual e moral causada pela Reforma, o Renascimento, a alta de preços e o nascimento do Estado moderno soberano transtornaram as estruturas da atividade econômica. Os Estados nacionais, rechaçando a autoridade universal da Igreja romana, adotaram atitudes belicosas, defensivas ou imperialistas. Os príncipes, pressionados por necessidades prementes de dinheiro, procuraram organizar a atividade econômica com vistas ao interesse nacional.

Todas estas preocupações deram origem ao mercantilismo. A idéia essencial dos mercantilistas era que, para fortalecer e aumentar seu poder, o Estado devia alcançar o nível máximo da posse de metais preciosos, então considerados como a riqueza de maior valor.

A nova orientação dada à economia política teve início com duas obras: a de Quesnay e a de Adam Smith. Na França Quesnay, chefe da economia fisiocrática, publicou seu Tableau économique. O “quadro econômico” mostra como as riquezas circulam no organismo social segundo regras derivadas da ordem natural. Proclama que o dinheiro é só um intermediário e que a verdadeira riqueza deriva do produto líquido consumível, ou seja, da parte que excede os gastos nos quais se incorreu para gerá-lo. O produto líquido circula no corpo social da mesma forma que o sangue no corpo humano, porque os proprietários e os manufaturadores necessitam comprar produtos agrícolas dos agricultores, enquanto estes precisam comprar os produtos manufaturados. O produto líquido não existe na indústria nem no comércio, é somente a agricultura que o provê. Em virtude disto a agricultura merece ser qualificada como produtiva. Os comerciantes e os industriais constituem uma classe estéril, porque eles não criam a riqueza: se limitam a transformar a riqueza já existente.

Na Grã-Bretanha, Adam Smith, autor de A Riqueza das Nações, pensou, como os fisiocratas, que existia uma ordem econômica natural cujas leis a ciência deveria descobrir. Mas enquanto para seus predecessores o fundamento era de índole metafísica, para ele era de índole psicológica: o equilíbrio econômico, a adaptação da oferta à demanda nos intercâmbios se baseia no fato de que os interesses particulares, supondo que sejam livres, tornam realidade o interesse geral. Em um cenário de livre intercâmbio, cada um se especializará e esta divisão de trabalho assegurará uma eficácia cada vez maior da produção, ou seja, uma maior produtividade.

Mas a rápida expansão da população, em uma época onde a produção agrícola não aumentava em absoluto, fez com que nascessem prognósticos pessimistas acerca do futuro do bem-estar da humanidade. T. R. Malthus no seu Ensaio sobre a população, sustenta que o obstáculo principal para progresso do bem-estar está na tendência para a multiplicação da raça humana, incremento que é de ritmo mais rápido que o da produção requerida para a subsistência. Se nada diminuísse sua expansão, a cada 25 anos se duplicaria a população, enquanto os meios de subsistência aumentariam segundo uma progressão aritmética. O meio para restabelecer o equilíbrio seria a repressão (guerras, fome, epidemias) ou a prevenção (restrição voluntária da natalidade).

A revolução industrial

A noção de revolução industrial se atribui geralmente a Arnold Toynbee (1852-1883). Paul Mantoux (1877-1956) a adotou em uma obra publicada em 1906. Um e outro descrevem o processo que abalou a Inglaterra de 1760 a 1840. Na realidade, Marx havia feito no primeiro volume de O Capital (1867) a descrição do fenômeno. Este sistema de desenvolvimento econômico é próprio do Ocidente europeu.

Efetivamente, o desenvolvimento capitalista é o único que permitiu não só a transformação do mundo inteiro, mas a universalização da História.

A revolução industrial afetou, em primeiro lugar, a Inglaterra no século XVIII, e depois o resto do mundo no período seguinte.

Na Inglaterra se fundou uma sociedade de cientistas, a Royal Society of London (1660), protegida pelo rei, que mantinha contatos regulares com os operários e os colonos, que lhe proporcionavam a base de experimentação científica. No século XVIII se desenvolveu e difundiu uma nova filosofia da natureza. O Século das Luzes descobriu a noção de progresso e estabeleceu as relações entre a ciência e a tecnologia.

Pela primeira vez, a ciência se aplicou sistematicamente ao processo de produção, o que permitiu o descobrimento de novas matérias primas (ferro, aço), de novas fontes de energia (o carvão e o vapor, a eletricidade e o petróleo, e finalmente a energia nuclear) e de máquinas automáticas (primeiro, as mecânicas; depois, as elétricas e por fim, eletrônicas).

A atividade econômica se concentrou e se especializou, a fábrica constituiu a nova organização de trabalho. Pela primeira vez, a produção superou o caráter local ou familiar para alcançar sistematicamente o caráter nacional e internacional.

As comunicações experimentaram um grande desenvolvimento e as cidades tiveram um impulso sem precedentes. A produção agrícola deixou de ser básica e a produção industrial adquiriu uma importância preponderante.

Apareceram e se desenvolveram novas classes sociais: a burguesia industrial e o proletariado moderno. As condições indispensáveis para o desenvolvimento da revolução industrial foram: a existência de um capital significativo, a presença de mão-de-obra disponível e o progresso da tecnologia.

A base de toda superprodução social e de toda civilização é a superprodução agrícola. Mas enquanto esta conservou o aspecto de uma renda em espécies, o dinheiro e o capital só ocuparam um lugar muito limitado na sociedade.

Com a aparição da moeda, o dinheiro que as antigas classes proprietárias utilizavam para adquirir produtos supérfluos foi para as mãos dos comerciantes e usurários. A primitiva forma de existência do capital foi o capital usurário, cujo empréstimo com enormes juros para os poderosos, permitiu a recuperação e o lucro.

Este capital comercial se ampliou por meio da criação de um mercado mundial de artigos supérfluos, que constituiu uma autêntica revolução comercial O aumento da quantidade de metais preciosos em circulação resultou numa revolução dos preços, cujo aumento não compensou a perda de valor da moeda.

A indústria doméstica presenciou o progressivo triunfo do comerciante sobre o artesão. Os comerciantes começaram a financiar os artesãos do campo, que produziam a domicílio e recebiam deles as matérias primas e os meios de produção. Deste modo, acabaram por trabalhar em troca de um simples salário.

A manufatura permite subdividir cada ofício e cada processo de produção e reduzir as operações do trabalho a alguns gestos mecânicos e simplificados, com o fim de aumentar o rendimento e de utilizar mão-de-obra não qualificada e mal paga.

O aparecimento de mão-de-obra disponível para as grandes empresas modernas obteve-se por meio de uma revolução que expulsou do campo a população, até então essencialmente camponesa.

No século XV começou na Inglaterra o movimento de fechamento dos campos. Consistia em repartir entre os proprietários (essencialmente, os grandes proprietários) os terrenos comuns aos quais os camponeses da Idade Média tinham livre acesso. O movimento visava à constituição de grandes propriedades cercadas, para cuja manutenção basta uma mão-de-obra reduzida. A redução da necessidade de mão-de-obra e o aumento das contribuições territoriais aceleraram a expropriação dos camponeses pobres.

No final do século XVIII, a multidão de camponeses, ao ficar sem meios de subsistência devido ao fechamento dos campos, abandonou o campo para dirigir-se às cidades.

No século XVIII se produziu na Inglaterra um duplo movimento: um que tendia a criar nas cidades uma massa de produtores aos quais se havia privado de todo controle dos seus meios de produção, e outro cuja finalidade era criar uma massa de trabalhadores expulsos do campo, onde era impossível que subsistissem. Do encontro desta nova classe, que só podia viver alugando sua força de trabalho, com os proprietários de um capital significativo, nasceu a forma moderna da indústria: uma classe proprietária dos meios de produção e uma classe produtora de mais-valia.

O aparecimento da grande produção industrial implicou na constante ampliação do mercado e, portanto, na queda do preço dos produtos fabricados. Isto só pode ser alcançado por meio da mecanização das indústrias. Esta mecanização começou no ramo têxtil e continuou com o uso industrial do carvão e do ferro, tudo isto acompanhado do descobrimento da máquina a vapor.

A mecanização provocou uma concentração em maior escala que a manufatura. À concentração geográfica, provocada inicialmente pela necessidade da indústria do algodão de se instalar próximo dos cursos d’água, se somou, a partir de 1875, a concentração ao redor das jazidas de carvão, e depois, ao redor dos mercados ou dos grandes centros de mão-de-obra.

A crise de produção começou a surgir. Apareceram abundantes e novas contradições. A destruição das máquinas pelos operários, que os deixavam sem meios de sobrevivência, provocou violentas revoltas.

A população das cidades cresceu desmedidamente e se deslocou para as novas zonas industriais. No século XVIII, mais de três quintos da população inglesa estava concentrada em uma faixa que se estendia entre o canal de Bristol e Londres. Em doze anos, Manchester, centro básico da nascente indústria do algodão, dobrou sua população.

A existência de uma grande massa de mão-de-obra disponível permitiu à burguesia capitalista exercer uma pressão sobre os salários e aumentar o tempo de trabalho. Este aumentou sem que aumentassem os salários, o que produziu o aumento da mais-valia absoluta. No século XVIII, uma jornada normal de trabalho na Inglaterra durava de 13 a 14 horas. Nas fiações de algodão, a semana de trabalho, em meados do século XVIII, era de 75 a 80 horas. Diminuiu para 72 horas no final do século XVIII, mas voltou a crescer para 80 horas em 1804. Um dia parado equivalia a um dia sem pão.

Mas a organização da resistência operária provocou, no século XIX, uma limitação legal na duração da jornada de trabalho. Primeiro para 12 horas, depois para 10 horas e finalmente para 8 horas no século XX. Para aumentar a mais-valia, o capital tentou reduzir o horário de trabalho necessário para produzir o valor do salário pago ao operário. Tratava-se do aumento da mais-valia relativa, ou seja, da produtividade do trabalho. Este é o resultado de uma divisão do trabalho mais pesado, de uma organização mais despótica na fábrica e do emprego de novas máquinas. O tempo de trabalho necessário para fabricar os produtos caiu. Nos Estados Unidos eram necessárias 1.000 horas para fabricar 100 pares de sapatos em 1860 e em 1895 eram suficientes menos de 100 horas.

A intensificação do trabalho graças à aceleração do seu ritmo e do aumento do número de máquinas controladas por cada operário provocou uma crescente exploração do trabalhador. A introdução da mecanização provocou, em primeiro lugar, consideráveis demissões, seguidas por uma redução de salários. Em 1824-1825 a incorporação do tear mecânico provocou uma redução de 50% nos salários dos tecelões ingleses. A demissão de uma massa de operários se converteu na formação de uma reserva de mão-de-obra industrial, que influiu nos salários. O maquinário industrial desvalorizou o conjunto do trabalho manual ao transformar os operários qualificados em operários não qualificados ou semi-qualificados.

Esta relação não tem fim, pois ainda hoje seguimos subjugados pelos mecanismos de controle e exploração do mercantilismo contemporâneo através de suas distintas formas.

Glossário de termos econômicos

Bolsa: lugar de encontro daqueles que tentam colocar seu dinheiro e de outros que, investido anteriormente, desejam vender sob a forma de títulos.

Inflação: é o aumento geral, sustentado e substancial, dos preços de uma economia.

I.P.C: Índice de Preços ao Consumidor. Informação obtida sobre as variações dos preços de alguns bens selecionados.

Hiperinflação: “inflação galopante”. Aquele processo inflacionário de forma vertiginosa, tornando praticamente impossível seu controle.

Deflação: situação caracterizada pela queda generalizada e persistente dos preços.

Tarifas: São direitos de aduana que devem pagar os importadores de determinados produtos às autoridades econômicas do seu país.

Balança de pagamentos: documento contábil em que aparecem registradas todas as transações econômicas que se realizaram durante um ano entre os sujeitos econômicos de um país e o resto do mundo.

P.N.B.: Produto Nacional Bruto. É a soma dos valores de todos os bens e serviços finais produzidos pelos habitantes do país durante um ano.

P.I.B.: Produto Interno Bruto. É o resultado da soma do valor de todos os bens e serviços produzidos no país, sem levar em conta a valorização dos que tenham sido elaborados pelos fatores produtivos nacionais no estrangeiro.

Lucro: diferença entre o preço de venda e a importância que custa elaborar cada unidade produzida.

Ponto morto: volume de produção em que a empresa nem perde nem ganha.

População ativa: conjunto de indivíduos que são aptos para trabalhar no contexto da legalidade vigente.

Capital: é o fator de produção constituído pelo conjunto de elementos que a fazem possível, incluindo os bens produzidos com objetivo de utilizá-los no processo produtivo.

Capital fixo: edifícios, máquinas, ferramentas.

Capital circulante: matérias-primas, artigos semi-elaborados, embalagens.

Mercado: conjunto de atividades relativas à compra e venda de um determinado bem.

Gasto público: conjunto de obrigações de pagamento contraídas pelo Estado como conseqüência do consumo, de investimentos e das transformações que realiza.

Dívida pública: conjunto de empréstimos concedidos ao Estado por particulares, empresas e entidades financeiras, documentados na forma de títulos de valores.

Economia: aquela parte da renda obtida e não gasta em um determinado período.

Investimento: é a diferença entre os capitais produtivos de dois períodos determinados.

Renda nacional: soma total das rendas geradas a favor dos possuidores dos fatores de produção nacionais, como contraprestação a sua participação no processo produtivo.

Renda per capita: é o resultado da divisão da renda nacional de um país pelo número dos seus habitantes.

Sociedade Anônima: é aquela sociedade capitalista que, com um capital próprio dividido em ações e sob o princípio da responsabilidade limitada dos sócios, se dedica à exploração de uma indústria mercantil.

Sociedade Limitada: tem uma dimensão mais reduzida que a S.A. , tanto quanto ao número de sócios como ao valor do capital social.

Autor

Revista Esfinge