Há uns vinte cinco anos estreou o primeiro filme da série Star Wars e desde então temos tido tempo para vê-la, desfrutá-la e por que não? Há muitos outros que falam dos efeitos especiais, sobre ser impossível que no espaço os X-Wing possam ressoar, pois o som não pode se propagar no vazio, ou sobre qual é a magia que faz com que as túnicas dos Jedi não se molhem quando visitam a cidade submersa dos Gungan, e ainda discutem se Anakin tem o nível mais alto de “miriclodianos” de toda a galáxia. Nesta ocasião vamos falar de outra magia, de algo menos fantasioso, talvez, mais próximo de nós, do valor humano, do heroísmo e da mística em Star Wars.

Do pouco que observamos no fenômeno Star Wars, vemos que seu êxito não só se deve aos espetaculares efeitos especiais de ILM (que eu desfruto como todos), mas também à introdução no roteiro de uma ordem de Monjes-Guerreiros, os Jedi, de características muito especiais e com toda uma filosofia de vida. No cinema podemos ver muitos tipos de heróis, muitos guerreiros corpulentos e hábeis, mas neste caso estamos falando de um herói cujos poderes e habilidades não estão em função de sua fortaleza física, seu valor temerário, nem sua inteligência, senão em seu grau de união, em seu grau de fusão mística com A Força, de união com a idéia de Deus, com isso que subjaz oculto em todas as partes e que anima todas as coisas, mas que somente uns poucos podem sentir. E, como toda religião que se preze, esta tem uma lenda, a profecia de que haveria de nascer o escolhido, o que traga o equilíbrio à Força e que será concebido sem pai, por vontade da Força, por mediação dos miriclodianos. No episódio 1, Anakin (o suposto eleito) pergunta a Qui-Gon Jinn (Mestre de Obi): O que são os miriclodianos? E este lhe responde algo assim: “Os miriclodianos são formas de vida microscópicas que residem em todas as células vivas, estamos em simbiose com eles. Sem os miriclodianos a vida não existiria, nem tampouco conheceríamos A Força; eles nos falam continuamente, comunicando-nos a vontade da Força, quando souberes silenciar tua voz poderás escutá-la.”

Estas são algumas das frases extraídas da série e que fazem referência do culto Jedi à Força:

“O poder de um Jedi flui da Força”

“O crepúsculo chega e a noite deve cair, assim é a ordem das coisas, a ordem da Força”

“Nosso encontro não foi uma coincidência, nada ocorre por acidente. Encontrá-lo foi vontade da Força”

“A guerra não lhe torna alguém mais grandioso”

“Vive o momento, não penses, sinta, utilize teu instinto, sinta A Força”

“Bem, calma, pois através da Força verás coisas, outros lugares, o passado, o futuro, os velhos amigos que se foram…”

“Sempre em movimento está o futuro”

“Não, não tentes fazer: faça ou não o faça, mas não tentes”

Em Star Wars se introduz uma nova Religião-Filosofía, cujos seguidores são os Cavaleiros Jedi, guardiões da paz e da justiça na galáxia, os quais têm que passar duras provas para chegar ao grau de Cavaleiro, e para sua formação necessitam de um mestre, guia que lhes abra a porta aos mistérios da Força, que lhes faça sentir a Força, que lhes ensine a trabalhar com Ela. No episódio 1 “A ameaça fantasma”, vemos como Anakin, o que depois se tornará Darth Vader, pai de Luke Skywalker, não é aceito no círculo dos Jedi por ter passado da idade. Aqui vemos como George Lucas vai bem longe e deixa entrever o incrível preparo que necessita um aspirante Jedi já desde muito pequeno, uma formação sobre tudo moral e ética que faça dele Cavaleiro inquebrantável, sempre a serviço do lado luminoso da Força, capazes de resistir à sedução do reverso da Força, de seu lado escuro.

A existência do reverso, do lado escuro, põe em evidência que, além de sentir a Força e de trabalhar com Ela, o Jedi deve ser um homem íntegro, com um especial equilíbrio interior, no qual não exista o ódio nem a violência, senão um afã de serviço aos demais, à justiça, à ordem, à verdade, afim ao bem. Sem esse estado de graça, sem essa preparação interior, sem essa pureza de pensamentos, sentimentos e atos, o Jedi corre o perigo de servir ao lado escuro, de colocar-se a serviço de obscuros interesses, ao serviço do ódio e da violência. Somente o Jedi que fez seu heróico trabalho interior, de transmutar seus escuros elementos internos num diamante puro e cristalino, pode enfrentar-se com o reverso da Força e sair vencedor. Recordemos que Luke, durante sua preparação no pantanoso planeta Dagobah, pela mão do Mestre Yoda, entra em uma zona habitada pelo reverso e se enfrenta com o lado escuro, enfrenta a si mesmo e sai derrotado.

Yoda instrui a Luke no planeta Dagobah a cerca dos perigos do reverso:
“- Isso é, corre, corre, o poder de um Jedi provém da Força, mas cuidado com o reverso tenebroso: ira, medo, agressão, o reverso tenebroso te dá forças, elas se movem com facilidade e em seguida te induzem ao combate; se alguma vez caíres no reverso tenebroso, ele dominará para sempre teu destino, te consumirá como fez com o discípulo de Obi-Wan Kenobi.

– É mais forte o reverso tenebroso? Não! Ele é mais rápido, mais fácil, mais sedutor…
– Como diferenciar o lado bom do mau?
– Saberás quando estiver tranqüilo, em paz, equilibrado. Um Jedi utiliza A Força como ciência e para defesa, nunca para atacar.
– Mas…Por que não posso…?
– Não há um porquê. Libera tua mente de perguntas.

– Esse lugar é propriedade do reverso da Força, tens que entrar, dentro há o que deves levar contigo; tuas armas, não as necessitará.

– Que não te invada o ódio, pois isso pode te salvar do reverso tenebroso”.

Também Yoda diz a Anakin quando ele se apresenta ao Conselho:
“O medo é o caminho para o lado escuro, o medo leva à ira, a ira leva ao ódio, o ódio…leva ao sofrimento”

Se passarmos um pente fino, veremos que para um Jedi o mundo é uma ilusão. Ele comunga com a realidade, com A Força, e daí que suas proezas, seus poderes, não são senão uma prova de que o mundo em que vive é uma ilusão, por tanto suas leis físicas, que também o são, podem ser alteradas, ultrapassadas e superadas, algo como no filme Matrix. Isso da sentido aos poderes de controle mental que o Jedi exerce, os saltos espetaculares, o controle de objetos a distância, o ver o passado e o futuro, ler os corações e as mentes dos demais, e, como não, a incrível habilidade com a espada a laser, uma arma que é nobre e símbolo, em todos os tempos, de valor e vontade, com a qual podem ser desviados os disparos de outras armas, as armas de distância, mais própria dos covardes, porque ferem de longe, e não cara a cara. Todos esses poderes vêm ao Jedi por sua união mística com A Força, com a realidade oculta, com o lado invisível das coisas. E o caminho que conduz a essa mística é a heróica luta contra tudo o que vem do reverso tenebroso, dentro e fora de si mesmo.

Yoda instrui a Luke no planeta Dagobah a cerca da falsidade de seus pontos de vista e seu conceito das coisas:
“Tem muito presente que teu enfoque determina tua realidade”

“Muitas das verdades que cremos dependem do ponto de vista”

“No há um porquê, libera tua mente de perguntas”

“Não, não é diferente, somente é diferente em tua mente; tens que te esquecer do que tens aprendido”

“Não importa o tamanho, olhe para mim, me julgas por meu tamanho, verdade? É? Não deveria fazê-lo; para mim o aliado é A Força, e é um poderoso aliado; A Força, a vida a cria e a faz crescer, sua energia nos rodeia e nos transpassa, nós dois, seres luminosos somos, não esta matéria bruta, deves sentir A Força a teu redor, aqui entre você e mim, sim, na árvore, na rocha, por todas as partes, inclusive entre a terra e o mar”

Não vamos aqui fazer um estudo comparativo dos ensinamentos que esta saga destila com os ensinamentos de outras filosofias, outras religiões ou outras culturas de nosso mundo que disseram coisas muito similares. Desfrutemos de toda a série Star Wars tal e como George Lucas nos apresenta.

E se, ao vê-la, desperta-nos alguma fibra interior, talvez descubramos com assombro que a ficção pode ser muito real.

Como diria o Mestre Yoda: “Difícil, a missão é, mas, impossível, não”.

Autor

Revista Esfinge