Para os antigos gregos, o Sítio de Tróia era o principal e maior acontecimento da Idade dos Heróis. Essa época prodigiosa em que os Imortais, que habitavam o Olimpo, e aqueles que os adoravam como Deuses, misturavam-se com os homens e participavam de seus assuntos.

Assim começa “A História de Tróia” de Roger Lancelyn Green, editado pela Siruela. Com Tróia, a idade heróica alcança o auge épico universal. Os Heróis são o fulgor da História, um brilho distante, resplendor da carne. De todas as lendas mitológicas do ocidente, as que pertencem ao belo povo grego são as que mais nos estremecem. Muitos são os livros que tratam de mitologia, legiões de obras que narram as aventuras e desventuras dos grandes Heróis e dos deuses olímpicos. A maioria dessas obras foi escrita das distantes alturas eruditas. Detesto os historiadores que falam e escrevem com frieza.

O bom historiador busca sempre uma posição distante e elevada, diziam na Faculdade os catedráticos de mentira. Baboseiras! O humano deve ser sempre apaixonado. Tem que sujar as mãos de vida e escrever somente sentindo o fragor da batalha, o rugido metálico do entrechocar dos escudos. Como não sentir uma profunda e sincera compaixão por Helena, causadora involuntária da guerra? Helena, por sobre os muros da sonhada Ílion, contempla a dor e a morte, o sofrimento dos gregos e troianos e exclama, despedaçada pela dor:

“Bem quisera que a cruel morte me tivesse arrebatado antes que Paris me levasse para longe de minha ditosa Esparta.”

Amor, sangue e traição são as palavras que servem de pilares nessa história de outrora. Tróia é a grande Cidade Invisível de nossa cultura, mostrada ao mundo pela magia de Heinrich Schileimann em 1868. Todos negavam sua existência, historiadores e arqueólogos a consideravam uma invenção de Homero, um conto de fadas, nada mais. Estavam errados!

Tróia resistiu ao assédio durante dez anos, porém a força das armas não conseguiu ir acima da astúcia do homem. Odisseu elaborara o estratagema mais famoso da história: o Cavalo de Tróia.

Em ouro, os gregos escreveram no lombo no cavalo:

“Para sua viagem de retorno, os gregos dedicam essa oferenda a Atena.”

Com essas palavras Ílion seria vencida. Apesar dos augúrios de Laocoonte, os troianos decidem introduzir o Cavalo na cidade. E aquela noite Tróia sucumbiu. Os ecos de sua grandeza foram se apagando, e sua glória, extinta. Sua lembrança, adormecida durante milênios nos versos dos bardos e trovadores.

Sempre há uma esperança. Da ruína, do fogo e da morte, um grupo de troianos consegue fugir. O capitão é o jovem Enéas. Fogem para o mar e depois de várias peripécias conseguem chegar a Cumas, na Itália. Ali, a Sibila anuncia que nas proximidades devem fundar uma cidade. Essa cidade, com o tempo, será chamada de Roma.

Iniciamos esse artigo com uma leitura de Roger Lancelyn Green, de igual modo acabaremos declamando uns versos do divino Homero. Na Ilíada, uma das passagens mais extraordinárias é o capítulo XXII, Morte de Heitor. Aquiles vai sozinho até as muralhas para vingar a morte de seu amado Pátroclo, desafiando Heitor para um combate único. Os versos 25-40 estão carregados de um forte dramatismo e tensão, pois o rei de Tróia, Príamo, ao ver chegar Aquiles, sente um grande pesar e medo pela sorte de seu filho Heitor.

25- O ancião Príamo foi o primeiro que, com seus próprios olhos, viu-o chegar pela planície, tão resplandecente como o astro, que no outono, distingue-se por seus vivos raios entre muitas estrelas durante a noite escura e recebe o nome de “Cachorro de Órion”, o qual, por ser brilhantíssimo, constitui um sinal funesto, porque traz excessivo calor aos míseros mortais; de igual maneira cintilava o bronze, sobre o peito do herói, enquanto este corria. Gemeu o velho, golpeando-se na cabeça com as mãos levantadas e proferiu grandes vozes e lamentos, dirigindo súplicas a seu filho. Heitor continuava imóvel diante das portas e sentia veemente desejo de combater com Aquiles. O ancião, tendo-o nos braços, dizia-lhe, em tom de lamento:

38- Heitor, filho querido! Não aguardes, só e distante dos amigos, esse homem, para que não morras nas mãos do Pélion. Ainda assim, infeliz pai, é o destino quem manda; e Heitor aguardou Aquiles…

Fermín Castro

Autor

Revista Esfinge