Embora, como já dito, a vocação não deva sofrer interferência nem ser manipulada, ela sim pode ser estimulada. O estímulo da vocação pode ser se realizar através de canais vocacionais, que teriam de formar parte das metodologias de ensino promovidas tanto pelas escolas quanto pelas autoridades responsáveis pela área da educação.

Ainda que existam atividades que possam tornar-se canais vocacionais, como por exemplo as feiras científicas, simpósios, carreiras técnicas do ensino médio, estágios, etc, o fato de nem sempre esses meios serem devidamente coordenados faz com que sejam perdidos como canais de estímulo da vocação.

Essas atividades são altamente motivadoras e servem para estimular, integrar e tornar participativos os estudantes nas diferentes áreas da educação, motivo por que as potencialidades vocacionais inerentes a todo estudante se expressam de forma clara e às vezes até contundente. Mas a falta de acompanhamento e coordenação nos programas de ensino faz que os educadores percam a continuidade do processo de engajamento dos alunos na descoberta da sua vocação.

Qualquer uma dessas atividades — ou outras — que possa gerar condições vocacionais, torna-se um canal vocacional quando os alunos participantes são observados e adequados, mediante critérios de participação, eficiência, resultados positivos, motivação, etc., às diferentes áreas de aprendizado relacionadas com as atividades realizadas nesses eventos. São muitos os exemplos de profissionais que direcionaram a sua vocação por resultados positivos nessa espécie de atividade. Seja por que um professor promoveu na sua matéria algum simpósio em que ofertou temas a escolher para os alunos, seja por que outro decidiu medir os conhecimentos dos seus alunos por meio de um seminário com temas livres.

Canais vocacionais são então esquemas de natureza administrativa que poderiam formar parte do conselho de professores de qualquer instituição educacional em que os alunos fossem observados de acordo com a sua performance, com relação à participação em eventos que estimulam as suas vocações. Se cada professor tivesse uma ficha de informações dos seus alunos sobre rendimento, qualidade, motivação, tendências, etc., com relação às suas participações nesse tipo de evento, e logo todas essas informações fossem cruzadas numa coordenadoria geral, poder-se-ia ajudar bastante os estudantes na busca de sua vocação.

Protagonistas da história – Alexander Fleming, além do azar

“Não tentava descobrir a penicilina, tropecei nela.” (A. Fleming)

Faz tão somente 75 anos que para curar feridas infectadas não havia nada além de iodo, ácidos carbônicos e outros medicamentos mais severos. Porém, quando as feridas eram profundas, os anticépticos não chegavam aonde se encontravam as bactérias, e, pior, destruíam os glóbulos brancos. Isso provocava muitas mortes, sobretudo de crianças e idosos, assim como também de mulheres que acabavam de dar à luz. A penicilina transformou essa situação.

Em 11 de março de 2005, se cumpriram 50 anos do desaparecimento de um dos cientistas mais importantes do século XX: Alexander Fleming. Nascido em 6 de agosto de 1881, em Lochfield, Grã Bretanha, no seio de uma família campestre, foi o sétimo de oito irmãos. Em sua infância já apreciava o gosto pela observação detalhada e a vontade singela que logo o haveria de caracterizar.

Quando seu pai morreu, foi viver em Londres com seu irmão Tom, que era médico e foi quem alentou em Alex o desejo de estudar medicina. Nessa época, morreu um tio dos Fleming que deixou para cada irmão 25 mil libras, o que tornou possível que Alex se dedicasse plenamente a sua carreira na escola de medicina de Santa Maria, em Londres, com que ficaria vinculado para o resto de sua vida. Em 1906, começou a fazer parte da equipe do bacteriólogo Sir Almroth Wright, com quem esteve associado por 40 anos. Licenciou-se em 1908, obtendo a medalha de ouro da Universidade de Londres.

Wright e Fleming buscaram os agentes farmacológicos que aumentaram a eficácia dos anti-corpos em sua luta natural contra os invasores microbianos. Durante oito anos trabalharam nesse problema, concluindo-o com êxito. Quando se instalou a primeira guerra mundial, foram enviados a serviço médico do exército, tendo salvo milhares de vidas com a vacina contra febre tifóide.

Regressando a seu laboratório, a partir de 1918, Fleming realizou investigações para encontrar um anticéptico efetivo. Foi assim que, em 1921, ao estudar sangue e outros fluidos corporais, descobriu a lisozima, uma enzima que é encontrada de forma natural em certos fluidos como a saliva e a lágrima. Ainda que tenha causado muita emoção e criado muitas fantasias com sua descoberta, essa enzima é efetiva contra bactérias que carecem de parede celular, mas não contra fortes agentes infecciosos bem equipados.

Sem dúvida, continuou buscando e buscando. Estava trabalhando com estafilococos, porém acumulava tanto trabalho no laboratório, que muitas vezes gerava desordem. Essa desordem foi muito afortunada para ele.

Foi na manhã de 03 de setembro de 1928. Alexander Fleming havia feito uma pausa no trabalho para conversar com um colega em seu laboratório do Hospital de Santa Maria, quando observou algo surpreendente em sua mesa. Em um recipiente de cultivo que deixara havia vários dias sem tapar apareceram uns “bolos” de mofo, e, ante sua perplexidade, aquela capa acinzentada havia provocado a morte das bactérias que a rodeavam.

A partir desse momento, o bacteriólogo dedicou toda a sua energia para realizar experimentos com aquele estranho mofo. Primeiro, verificou que desprendia uma substância antibacteriana em forma de minúsculas gotinhas de coloração áurea. Então, chegou à conclusão de que aquele líquido amarelo era tão eficaz quanto o próprio mofo. Também verificou que o mofo era um simples fungo e que era muito parecido com o que aparece comumente no pão ou no queijo, e ainda que causava efeitos mortíferos sobre os germes infecciosos. Pouco tempo depois de isolar o mofo, identificou-o como Peniciliun notatum. Acabava de descobrir a penicilina.

Porém, como aconteceu em outros muitos casos, Alexander Fleming também foi mal compreendido em sua época; e mais, seus colegas londrinos menosprezaram a importância de seu achado.

Sem dúvida, Fleming estava convencido de que tinha em suas mão uma poderosa arma contra as infecções. Em 10 de maio de 1929, publicou seu descobrimento, ainda que desgraçadamente, sua utilização clínica tenha ficado suspensa por mais de uma década. O problema estava em que, apesar de haver descoberto uma substância capaz de combater as infecções bacterianas, Fleming e seus colaboradores não conseguiam isolar a penicilina. A descoberta de Fleming caiu no esquecimento durante décadas, até que os pesquisadores Ernst Boris e Howard Walter Florey retomaram a investigação de Fleming na Universidade de Oxford e produziram a penicilina em estado puro em 1940, devido à necessidade de ter disponíveis substâncias antibacterianas para melhorar o tratamento dos soldados aliados feridos na Segunda Guerra Mundial. Seu papel no desenvolvimento da penicilina foi tão fundamental quanto as primeiras evidências que Fleming encontrou sobre as aplicações terapêuticas do fármaco, conseguindo isolar e produzir quantidades suficientes de penicilina para aplicá-la na cura de seres humanos, com o que se converteu no primeiro antibiótico com aplicações práticas da história e abriu caminho para uma autêntica revolução na medicina do século XX.

Boris e Florey receberam o prêmio Nobel de fisiologia e medicina junto com Alexander Fleming em 1945. O primeiro medicamento antibacteriano, o Prontozil, foi desenvolvido pelo químico Gerhard Domagk em 1935.

“Deus não joga os dados” é a famosa frase que Albert Einstein pronunciou para afirmar estar convencido de que a casualidade não existe na natureza, tudo tem uma causa ainda que não se faça evidente no princípio.

Por isso, ainda que Alexander Fleming, em sua modéstia, dissesse que ele não havia descoberto a penicilina, mas que havia tropeçado nela, é evidente que esse “tropeço”, essa aparente casualidade era o fruto de toda uma vida dedicada à investigação das defesas do corpo humano contra as infecções bacterianas. E somente alguém com esses conhecimentos e dotado de sua capacidade de observação haveria podido perceber que algo pesava nesse prato com mofo.

Com um certo atraso a fama chegou, por fim, até Fleming, que foi eleito membro da Royal Society em 1942 e recebeu o título de Sir dois anos mais tarde. Quando morreu de um ataque do coração em 11 de março de 1955, foi chorado por meio mundo e foi enterrado como herói nacional numa cripta da Catedral de St. Paul em Londres.

Angel García Rodríguez, catedrático de microbiologia na Universidade de Salamanca assinala que “sem medo de equivocar-se se pode afirmar que o descobrimento da penicilina foi a conquista mais importante da medicina do século XX. A partir de então começou uma nova etapa conhecida como a era dos antibióticos.” Não podia ser para menos, já que depois se conseguiram as penicilinas semi-sintéticas, as de amplo espectro e as de ação anti-pseudomonas. Por isso, García Rodríguez afirma que “os antibióticos não somente têm contribuído de forma decisiva para diminuir a mortalidade por enfermidades infecciosas de origem bacteriana, mas também têm propiciado o desenvolvimento de outras áreas médicas através do controle da infecção”.

Aqui vai nossa homenagem a esse herói da ciência no 50º aniversário de sua morte.

Julián Palomares

Autor

Revista Esfinge